Como supor e adivinhar os desejos e vontades de alguém? Seria necessariamente por suas ações? Ou por suas falas? Por seu comportamento?
E quando colocamos tais perguntas em relação às pessoas dentro do transtorno do espectro do autismo (TEA)? Isso se altera em que sentido?
É verdade que no universo neurotípico (pessoa sem qualquer distúrbio ou transtorno neurológico), a depender do grau de intimidade, o quanto se conhece de uma pessoa, seja por seu olhar, ou por sua linguagem corporal, às vezes conseguimos adivinhar sobre seus anseios, desejos, interesses e vontades – que muitas vezes permanecem no âmago do consciente, ou inconsciente de cada ser humano. Temos ainda aquelas hipóteses em que uma boa linguagem e comunicação coincidem a íntima vontade de uma pessoa.
Ao nos transpomos para a população dentro do TEA, a questão fica um tanto mais complexa. Explico: seja um autista leve, moderado ou severo (atualmente fala-se em “níveis”), e sendo a comunicação verbal ou gestual, e sociabilidade, seus principais pilares diagnósticos, não poderíamos, nunca, jamais, pressupor suas vontades.
No âmbito da intenção de sociabilização desta população, o assunto fica ainda mais intrigante: será que podemos realmente supor que eles não querem sociabilizar, não querem participar de um grupo? Seja por não responderem, ou responderem inadequadamente, aos (poucos, na maioria das vezes) chamados de integração que recebem? Ou por responderem um “não quero participar” por algum motivo mais profundo? Enfim, como opinar se determinada pessoa quer ou não participar de um grupo social? Afinal, caberia a alguém este julgamento, interpretação ou opinião?
A verdade é que as pessoas com autismo são tão diferentes entre si, sendo uns muitíssimo sinceros, outros tímidos, retraídos, e outros expansivos, os que têm como desafio a interpretação da linguagem, inclusive a corporal, dentre outros. Alguns possuem percepção de que sejam, de alguma forma, diferentes daqueles que os rodeiam, e outros não.
Há ainda um estigma que ronda essa população tão diversa, como pessoas que “vivem em seus mundos”. Nada mais capacitista do que pressupor que alguém não quer ou não consegue socializar. Esse julgamento discriminatório é tão ultrapassado quanto o da culpa materna pelo autismo, tal qual sugerida por interpretações de Leo Kanner.
E qual o ponto comum a respeito da vontade de sociabilizar das pessoas com TEA? Suas histórias individuais os constroem. Seja com traumas, com bullying, desmotivação, ou o oposto, com bastante motivação.
Conhecer sempre a história e a causa para qualquer tipo de expressão a respeito da socialização é um início do caminho a ser considerado.
Por exemplo, fatores como: constatação de timidez, a fase de aprendizado sobre as maneiras de socializar, entonação de voz e palavras aguardadas pelo ouvinte devem ser levados em consideração. Ou mesmo, e por quê não, a real e sincera mera falta de vontade em socializar.
Que não desistam. Pessoas com TEA e aqueles que os cercam. Cabe a nós construirmos, a partir de hoje, e com urgência, uma história de respeito, empatia e inclusão social das pessoas com TEA.
Fonte: Revista Preven